José Roberto Rozante , Carlos Fernando Lemos
A precipitação é uma das variáveis meteorológicas mais importantes para os estudos climáticos das diversas regiões do Brasil. Tal importância deve-se às conseqüências que estas podem ocasionar, quando ocorridas em excesso (precipitação intensa), para os setores produtivos da sociedade tanto econômico e social (agricultura, transporte, hidrologia, etc), causando enchentes, assoriamento dos rios, quedas de barreiras, etc.
Chuva intensa define-se como sendo aquela que registra um grande volume de água precipitado num curto espaço de tempo. Por exemplo, uma chuva de 20 mm, ocorrida em 24 horas, é considerada fraca, no entanto, este mesmo valor, ocorrido em poucos minutos, que caracteriza a chuva de verão, é geralmente forte e a ocorrência é conhecida popularmente como pancadas de chuva.
Estas chuvas intensas ocorrem isoladamente ou associadas a outros sistemas meteorológicos. As precipitações intensas, geralmente estão acompanhadas de trovões, descargas elétricas, granizos e ventos fortes. A nuvem característica é o cumulonimbus, cuja base pode situar-se entre 300 e 3000 m, dependendo da umidade relativa do ar próximo ao solo. O fator favorável para o seu desenvolvimento é a presença de ar quente, úmido e instável. Nas regiões montanhosas as formações isoladas são comuns e isto deve-se a um forte gradiente térmico vertical, como resultado de aquecimento diurno intenso
2. Métodos de medição e estimativa de Precipitação
2.1) Medição
A variável precipitação pode ser quantificada através de dois instrumentos meteorológicos, o pluviômetro (recipiente que acumula a chuva) e o pluviógrafo (registra continuamente através de um gráfico a precipitação no decorrer de um intervalo de tempo). A unidade de medição habitual é o milímetro de chuva, definido como a quantidade de precipitação correspondente ao volume de 1 litro por metro quadrado de superfície.
Embora a obtenção dos dados de chuva através destes instrumentos seja bastante confiável, a dificuldade que se tem está na deficiência de estações meteorológicas em algumas regiões do Brasil.
Para suprir estas deficiências, o sensoriamento remoto tem sido muito utilizado pelos meteorologistas nos dias atuais com aplicação de técnicas de estimativa de precipitação, utilizando imagens de satélites e radares meteorológicos.
2.2) Estimativa de precipitação através de radares
O radar meteorológico é uma ferramenta de grande importância para o meteorologista, e através dele pode-se monitorar o surgimento, intensificação e deslocamento das células convectivas que provocam fortes chuvas. Dessa forma pode-se alertar com antecedência os orgãos competentes (defesa civil, companhias hidroelétricas e a aviação). Um exemplo de aplicação, pode ser visto na fig (1) .
As áreas coloridas representam as precipitações sobre a área de cobertura (circunferência) do radar da cidade de Bauru localizada no Estado de São Paulo, para o dia 29/11/94 às 4:31 h, conforme anotados no quadro situado no canto superior direito da figura. A imagem é apresentada com sua máscara padrão onde é delimitado o limite estadual sudoeste, acrescida da máscara com o curso do rio Tietê e a localização de algumas cidades. As intensidades das precipitações são escalonadas conforme tabela vertical (canto inferior direito) com valores em refletividade (dBZ). Os valores mais altos de refletividade são associados com a intensidade maior de precipitação.
As imagens do produto CAPPI ( Constant Altitud Plan Position Indication) permitem uma observação mais detalhada das áreas de precipitação sobre a região Central do Estado de São Paulo. Essas imagens geradas com raio de alcance de 240 km possuem uma resolução muito superior às imagens de satélite, mesmo as de satélites de órbita polar, que apresentam uma melhor definição das áreas de chuvas.
2.3) Estimativa de precipitação por satélite
A estimativa de precipitação por satélite vem se firmando na atualidade como um grande benefício para a meteorologia, uma vez que temos uma deficitária rede pluviométrica, bem como pequeno número de radares meteorológicos (Vianello, 1991).
Para estimar a precipitação utilizando os diversos canais espectrais dos satélites, várias técnicas são usadas ( algorítimos computacionais), todas elas de natureza empírica. Os algorítimos elaborados para a estimativa de precipitação podem apresentar graus variados de complexidade, podendo ir desde os mais simples ( fundamentado apenas no desenvolvimento vertical das nuvens convectivas), até técnicas mais elaboradas, como aquelas em que se utiliza imagens multi-espectrais digitais de alta resolução (Univap, 1995). Ver figura (2) .
3) Precipitações intensas nas regiões do Brasil
A seguir citaremos alguns casos de ocorrências abundantes de precipitação em determinadas regiões do Brasil extraídos dos Boletins Climanálise do período de outubro de 86 a julho de 96.
Regiões Sul, Sudeste e Centro Oeste
As Regiões Sul, Sudeste e Centro Oeste são atingidas principalmente nas estações de primavera e verão por vórtices ciclônicos e aglomerados convectivos. Estes sistemas são intensificados, quando associados a sistemas frontais.
a) El Niño 86/87 - Nos meses de Junho e Julho de 87, ocorreram enchentes sobre a Região Sul. Estas chuvas intensas afetaram os setores oeste/centro do Rio Grande do Sul, onde ocorreu uma anomalia positiva de 300 mm. Nas localidades de Bagé-RS e Sant'Ana do Livramento-RS, o total de chuvas mensais registradas foi de 500 mm .
b) Vórtice Ciclônico - Atuou em abril de 1991 e maio de 1993, no oeste da Região Sul. As precipitações foram abundantes no oeste do Paraná, Santa Catarina, oeste e centro do Rio Grande do Sul.
Nos dias 22, 23 e 24 do mês de dezembro de 1995, um vórtice ciclônico, localizado no oeste da Região Sul, causou chuvas intensas no noroeste e norte do Rio Grande do Sul, e em Santa Catarina. Na cidade de Florianópolis (do dia 22 para o dia 23), foi registrada chuva de 412 mm.
c) Aglomerado Convectivo- Em dezembro de 1986, registraram-se chuvas intensas no sul de Minas Gerais e em pontos isolados deste Estado.
Em fevereiro de 1988, um aglomerado convectivo causou chuvas fortes no litoral norte de São Paulo, sul de Minas Gerais e sul do Rio de Janeiro.
d) Sistema Frontal - Entre os dias 27 e 30 de Julho de 1989, no Paraná, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e em São Paulo, foram registradas chuvas intensas e ventos fortes principalmente na região de Ivinhema-MS.
No dia 26 de abril de 1991 e em janeiro de 1995, um sistema frontal causou chuvas e ventos fortes sobre a cidade de São Paulo e Rio de Janeiro.
Nos dias 12,13 e 14 de Fevereiro de 1996, no litoral de São Paulo e Rio de Janeiro, uma frente fria causou chuvas intensas, sendo registrado na localidade de Ubatuba-SP, no dia 12, precipitação de 246 mm, e no dia seguinte 150 mm. A chuva acumulada nestes dois dias, ultrapassou a média mensal climatológica deste mês para esta cidade que é de 301 mm.
Regiões Norte e Nordeste
Os sistemas que atuam sobre as Regiões Norte, Nordeste, são linhas de instabilidade associadas à brisa marítima, distúrbios de leste, vórtices ciclônicos e sistemas de grande escala como a ZCIT (Zona de Convergência Intertropical).
a) Linha de Instabilidade associada com a brisa marítima - Em março de 1986, no norte do Ceará o total de precipitação mensal foi superior a 500 mm, mais ou menos o dobro da média, o que provocou inundações em muitas localidades.
Na Região Norte, em maio de 1989 o desvio de precipitação da cidade de Manaus e do Estado do Amapá foi de 120% acima da normal climatológica devido à formação de linhas de instabilidade sobre estas regiões.
Em abril de 1995, na localidade de Soure no Pará, houve um desvio positivo de precipitação superior a 1000 mm.
b) Distúrbios de leste - Em julho e agosto de 1989, os desvios positivos de precipitação foram superiores a 300 mm no litoral de Pernambuco e em Guaramiranga-CE.
Em Junho de 1994, ocorreram chuvas intensas na Região Nordeste. Em Fortaleza-CE a precipitação mensal, foi aproximadamente três vezes superior a média climatológica. Em algumas localidades do Piauí, os totais mensais foram sete vêzes superiores a média climatológia. Este excesso de precipitação foi causado pela atuação de distúrbios de leste e pelos ventos alísios que formaram uma zona de confluência sobre a região norte do Nordeste.
Em abril de 1996, nos dias 28 e 29, houve chuvas abundantes e inundações na cidade de Recife.
c) Sistema frontal - Nos dias 10 e 12 de julho de 1989, sobre o litoral de Alagoas, um sistema frontal causou chuvas intensas e inundações na região litorânea deste Estado.
4) Bibliografia
INPE/CPTEC. Climanálise (1986 a julho 1996) - Boletim de Monitoramento e Análise Climática.
Nimer, Edmon (1979). Climatologia do Brasil . Volume 4 1979 . 420p. ilust.
UNIVAP (Universidade do Vale do Paraíba) (1995). Curso de Interpretação de Imagens e Análises Meteorológicas. 1995.
Vianello, Rubens Leite (1991) - Meteorologia Básica e Aplicações. Viçosa, UFV, Impr.Univ., 449p. ilust.