Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC)
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE)
Em altos níveis da atmosfera, próximo à tropopausa, existe uma região onde a componente do vento zonal, de oeste, atinge valores máximos. Esta componente aumenta com a altura devido à existência de gradientes meridionais de temperatura. O escoamento caracterizado por valores máximos é denominado de Corrente de Jato ou simplesmente Jato. Segundo Riehl (1969), a descoberta do Jato foi uma grande surpresa e ocorreu durante a Segunda Guerra Mundial, quando aviões bombardeiros sobrevoavam as Ilhas Japonesas a uma altura aproximada de 10.000 metros e algumas vezes permaneciam praticamente parados em relação ao solo, em virtude da existência de ventos fortes em sentido contrário .
2. Alguns Estudos Sobre o Jato
Desde a época da identificação, até os dias de hoje, muitos estudos foram realizados sobre essa região de fortes ventos zonais em altos níveis, porém poucos para a América do Sul. Atualmente é sabido que existem duas Correntes de Jato distintas (Reiter,1969). Uma delas é a Corrente de Jato Polar a qual não é muito regular e está associada ao forte gradiente horizontal de temperatura que ocorre nas estreitas zonas frontais, localizando-se no lado equatorial destas. Este jato encontra-se geralmente entre as latitudes de 35S a 70S. A sua posição é mais próxima ao equador durante o inverno do que no verão. A outra corrente, Jato Subtropical, está associada à circulação da Célula de Hadley e geralmente fica localizada no limite polar dessa célula, entre as latitudes de 20S a 35S. Esta corrente é mais regular e sua posição média muda em direção ao equador no período de inverno e em direção aos polos no verão.
Várias pesquisas já foram realizadas, onde direta ou indiretamente estudou-se a Corrente de Jato. Revisões históricas sobre a Corrente de Jato foram feitas por Riehl (1969) e Reiter (1969). A importância da Corrente de Jato é ressaltada em Browing (1985) que associa alguns casos de precipitação com a Corrente de Jato. Kousky e Cavalcanti (1984) relacionaram o padrão do escoamento em altos níveis a um bloqueio ocorrido na América do Sul durante o evento ENOS de 1983, ressaltando o papel do Jato Subtropical nas intensas precipitações sobre a Região Sul. Porém, do ponto de vista climatológico, do ar superior, pouco se fez. Chu (1985), apresentou em seu trabalho uma climatologia dos altos níveis da atmosfera, usando altura geopotencial, temperatura e vento, obtidos a partir de várias estações de radiossonda, para o período de 1980 a 1984. Hoskins et al. (1989), apresentaram mapas diagnósticos da circulação global atmosférica, usando médias trimestrais dos dados do ECMWF, no período de 1979 a 1989. Nestes mapas pode-se notar a presença dos jatos no Hemisfério Sul. A posição longitudinal e a intensidade dos jatos no Hemisfério Sul apresentam uma variação interanual, como visto na figura em James e Anderson (1984). Pezzi e Cavalcanti (1994) fizeram um estudo do escoamento em altos níveis (200 hPa) sobre parte da América do Sul, no trimestre de inverno (JJA), com o objetivo de identificar os principais padrões de circulação em altos níveis associados a Correntes de Jatos. Também analisaram a variação interanual e o comportamento da circulação em áreas distintas sobre a América do Sul. Neste estudo foram usados 10 anos de dados diários, do ECMWF, no período de 1980 a 1989, entre as latitudes de 60S e 20S e longitude de 40W a 80W. Pela Tabela 1, reproduzida a partir de Pezzi e Cavalcanti (1994), verifica-se que o maior número de casos com anomalias positivas, durante todo o inverno, ocorreu nas latitudes de 30S a 20S e o máximo ocorreu no mês de agosto, com 172 casos para os desvios (anomalias) maiores que 0 m/s. Vide ( Tabela 1 e Tabela 2 .
3 - Climatologia Sazonal da Corrente de Jato sobre a América do Sul para o Período de 1985 a 1994.
Foi feita uma análise do escoamento atmosférico com a finalidade de observar-se o comportamento sazonal e interanual da Corrente de Jato Polar e Jato Subtropical para a América do Sul. Calculou-se campos médios trimestrais de linhas de corrente em altos níveis (200 hPa) usando-se as análises do NCEP/NCAR. A seguir são apresentados os resultados das análises sazonais, interanuais e climatológicas para o período.
3.1 - Os meses de Verão (Dezembro, Janeiro, Fevereiro)
O trimestre de verão (D,J,F) foi calculado sempre usando-se o mês de dezembro do ano anterior ao mês de referência da média trimestral, por exemplo, no verão (D,J,F) de 1985 usou-se dezembro de 1984. Na média desse período o Jato Subtropical praticamente desaparece, prevalecendo o Jato Polar ou Extratropical. Pode-se observar que em apenas dois anos (1985 e 1991, Fig 1 ) há um núcleo mais intenso sobre a América do Sul Subtropical (principalmente em 1991) com ventos relativamente fortes. Durante o verão de 1991 o Jato Subtropical esteve associado à circulação da Alta da Bolívia, situando-se na área sul dessa circulação. Em alguns casos pode ocorrer a associação entre os jatos subtropical e extratropical. Na América do Sul, em alguns casos, o jato associa-se à atividade convectiva que ocorre sobre o Peru e Bolívia. Em um caso ocorrido em janeiro de 1988 (Climanálise,1988) este jato foi responsável por uma frontogênese sobre o norte de São Paulo, sul de Goiás, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Durante os meses de Verão, no Hemisfério Sul, o jato em média fica situado entre 40S e 50S ( Fig 1 ). Neste período (1985 a 1994) o núcleo do jato permaneceu sobre o Oceano Atlântico com ventos acima de 32 m/s. Outra característica que observa-se é a grande variabilidade interanual na intensidade do jato. Nos anos de 1992, 1993 e 1994 o jato esteve bem forte. No ano de 1989 e início de 1990, este sistema apresentou-se bastante fraco. De uma forma geral nos anos em que ocorreu o El Niño estendido, principalmente de 1991 a 1994, a Corrente de Jato no Atlântico próximo a América do Sul, foi mais forte do que no período de 1985 a 1989.
3.2 - Os meses de Outono (Março, Abril, Maio)
No outono o Jato Subtropical apresenta-se bem definido e em processo de intensificação. Durante este período a sua intensidade fica em média acima de 40 m/s, posicionado sobre o sul da América do Sul e Oceano Atlântico na faixa de latitude que vai de 30S a 40S (Fig 2 ). A intensificação do jato é uma resposta ao gradual aumento do gradiente meridional de temperatura. O fato mais significativo destes 10 anos é a ausência quase que completa do jato no ano de 1989.
3.3 - Os meses de Inverno (Junho, Julho, Agosto)
Nesta estação o jato atinge a sua máxima intensidade e atuação sobre a América do Sul. Nessa estação a intensidade pode alcançar valores médios de até 45 m/s. Em média encontra-se oscilando na faixa latitudinal de 25S e 30S, com configuração zonal ou com uma suave inclinação de noroeste para sudeste. Novamente pode-se observar na Fig 3 uma grande variabilidade na intensidade do jato. Nos anos de 1987, 1988, 1993 e 1994, o jato apresentou-se mais intenso.
3.4 - Os meses de Primavera (Setembro, Outubro, Novembro)
Durante esta estação o jato começa a perder força e o escoamento começa a apresentar uma curvatura anticiclônica em resposta ao aparecimento da alta da Bolívia. Em média a velocidade fica em torno de 34 m/s e o núcleo do jato posicionado na faixa de latitude de 30S. Durante os anos de 1987, 1990, 1993 e 1994 o jato estava bem forte. Por outro lado nos anos de 1985, 1989 e 1991, o jato apresentou-se mais enfraquecido. Nesta estação, devido ao transporte de ar quente e umidade, provenientes da Região Amazônica, pelo Jato em Baixos Níveis (JBN) para a região do Paraguai e norte da Argentina, e à presença do jato em altos níveis sobre as Regiões Centro-Oeste e Sul do Brasil, há a formação dos chamados Complexos Convectivos de Mesoescala (CCM) nesta área. A presença do jato em altos níveis executa o papel de aumentar a instabilidade. Ver Figura 4 (Ver seção ... de CCM).
4 - Bibliografia
Browing, K. A., 1985. Conceptual Models of Precipitation Systems. Meteorological Magazine, Bracknell. Eng. 114(1359):293-319.
Chu, P. S., 1985. A contribution to the upper-air climatology of tropical South America. Journal of Climatology. Vol. 5, 403-416.
Climanálise, 1988. Boletim de Monitoramento e Análise Climática. 3(1).
Hoskins, B. J., Hsu, H. H., James. I. N., Masutani, M., Sardeshmukh, P. D., White, G. H., 1989. Diagnostics of the Global Atmospheric Circulation. Based on ECMWF analyses 1979-1989. University of Reading. Departament of Meteorology. UGAMP Technical Report No 7. pp217.
James, I. N. and Anderson, D.,L.,T., 1984. The seasonal mean flow and distribution of large-scale weather systems in the southern hemisphere: the effects of moisture transports. Quart. J. R. Met. Soc., 110, 943-966.
Kousky, V., e Cavalcanti, I. F. A., 1984. Eventos Oscilação Sul - El Niño: Características, evolução e anomalias de precipitação. Ciência e Cultura 36(11), 1888-1899.
Pezzi, L.P., e Cavalcanti, I. F. A., 1994. O Jato Subtropical Sobre a América do Sul no Período de 1980 a 1989. VIII Cong. Bras. Met / II Cong. Lat. Iber. Met. Vol 2. 148-151.
Reiter, E. R., 1969. Tropopause Circulations and Jet Streams. World Survey of Climatology, v (4). Climate of Free Atmosphere, 85-204.
Riehl, H., 1969. Jet Streams of the Atmosphere. Medical Opinion & Review (September), 33-50.