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VÓRTICES CICLÔNICOS EM ALTOS NÍVEIS DE ORIGEM SUBTROPICAL


Maria Cristina Maciel Lourenço (*), Nelson Jesus Ferreira e Manoel Alonso Gan (**)

(*)Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC)

(**) Divisão de Ciências Meteorológicas (DCM)

Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE)


1. Introdução

Os vórtices ciclônicos em altos níveis (VCAN) de origem subtropical atuam sobre as Regiões Sul e Sudeste do Brasil por um período de 1 ou 2 dias provocando chuvas e ventos fortes. Um dos primeiros estudos a respeito de VCAN foi feito por Palmer (1951), que documentou a ocorrência de dois casos sobre o Oceano Pacífico Norte.

A influência de VCAN na região sudeste do Brasil foi estudada recentemente por Silva Dias e Grammelsbacher (1991) e Sakuragi (1992). O primeiro trabalho mostrou que a possível ocorrência de um tornado no dia 26 de abril de 1991 sobre Franco da Rocha e São Bernado do Campo estava associada à interação de um sistema frontal com um VCAN. Sakuragi (1992) demonstrou que chuvas intensas ocorridas em São Paulo, no dia 19 de março de 1991, estavam associadas a um VCAN que atuava na região.

Além de causar chuvas fortes, os VCAN também estão muitas vezes associados a ocorrência de geadas. Fortune (1982), estudou a severidade de uma grande geada ocorrida em 1981 e Ele constatou que um VCAN foi o elemento importante para a ocorrência de geadas nas regiões Sul e Sudeste do Brasil. Situações desse tipo geralmente causam grandes prejuízos para a agricultura, principalmente para a cultura cafeeira.

Apesar da grande influência dos VCAN no tempo das regiões Sul e Sudeste do Brasil, diversas características sinóticas desses sistemas (variações sazonais e interanuais, processos físicos envolvidos, manutenção, etc.) ainda não são bem conhecidos.

2. Características Sinóticas

Os VCAN são definidos como sistemas fechados de baixa pressão, de escala sinótica, que se formam na alta troposfera (Gan e Kousky, 1982). São comumente chamados na literatura de baixas frias, pois apresentam centro mais frio que a periferia. Com o auxilio de imagens de satélite meteorológico, observa-se que os VCAN, em determinadas situações, causam grande precipitação no Sul e Sudeste do Brasil. Normalmente estes vórtices originam-se no Oceano Pacífico e muitas vezes ao cruzarem os Andes provocam alterações no tempo nessas regiões e no Uruguai e norte da Argentina (Cavalcanti, 1982). Quando os VCAN penetram no continente, oriundos do Oceano Pacífico, normalmente ocorre instabilidade e precipitação nos setores leste e nordeste do vórtice. Os vórtices ciclônicos possuem uma vida média que varia consideravelmente, uns duram apenas algumas horas, outros mais de duas semanas. Ocasionalmente, os vórtices ciclônicos intensificam-se para baixo na vertical e podem refletir no campo de pressão em superfície.

Os VCAN podem ser classificados de duas maneiras: vórtices do tipo Palmén, que se originam nas latitudes subtropicais e os vórtices do tipo Palmer, também chamados de vórtices de origem tropical por originarem-se nessa região. Os vórtices ciclônicos de origem tropical formam-se nos meses de primavera, verão e outono e, passam a maior parte de suas vidas nos trópicos (Palmer, 1951). Segundo este autor, os vórtices ciclônicos de origem tropical apresentam as seguintes características: originam-se acima de 9000 m nas latitudes mais baixas, são persistentes, crescem e intensificam-se durante a passagem para as latitudes mais altas e, no Hemisfério Norte, deslocam-se para Nordeste ou Leste-nordeste no cinturão de 20o - 30o de latitude. Os vórtices ciclônicos na vizinhança do Nordeste do Brasil, formam-se devido `a intensificação simultânea da crista associada à Alta da Bolívia e o cavado corrente abaixo sobre o Oceano Atlântico (Kousky e Gan 1981). Isto ocorre quando um sistema frontal proveniente do sul do Brasil, ao penetrar nos subtrópicos, provoca forte advecção de ar quente no seu lado leste, amplificando a crista de nível superior e, por conservação de vorticidade absoluta, o cavado que está a jusante também é intensificado, formando-se o ciclone na alta troposfera (Ver seção 21, sobre os vórtices ciclônicos no NE).

Rao e Bonatti (1987), concluíram que a instabilidade barotrópica não é um mecanismo importante na geração dos vórtice ciclônicos. Eles sugerem a importância de outros processos, como a liberação de calor latente de condensação e variação diurna na intensidade do anticiclone sobre o continente sul-americano.

Os vórtices do tipo Palmén ( figura 1 ) formam-se em qualquer época do ano, inclusive no inverno. Tempestades do tipo "Kona" no Oceano Pacífico Leste estão associadas a esse tipo de ciclone (Simpson, 1952). Os VCAN formam-se devido à pré-existência de um cavado frio em altos níveis de latitudes médias, que ao penetrar nos subtrópicos pode ter uma inclinação meridional bem acentuada. Essa inclinação faz com que a parte do cavado, em baixas latitudes, tenha uma velocidade zonal inferior ao resto do cavado atrasando-se até desprender-se completamente. Desse modo, uma circulação ciclônica fechada ( figura 2 ) forma-se nesta parte desprendida, ou seja, quando massas de ar de altas latitudes associadas com cavados estendidos, tornam-se desprendidas.

Os vórtices ciclônicos podem também ser classificados como "úmidos" ou "secos", dependendo da quantidade de nebulosidade associada. Os vórtices confinados na média e alta troposfera possuem pouca nebulosidade e são denominados secos. Os vórtices "secos", como descrito por Frank (1970), estão caracterizados por movimento descendente e seco no seu centro. Os vórtices que atingem os níveis mais baixos da troposfera possuem bastante nebulosidade, sendo chamados de vórtices "úmidos". A nebulosidade associada varia, ocorrendo muitas vezes intensa nebulosidade e precipitação e outras vezes o céu está quase claro. Isto sugere uma reversão na circulação vertical (Frank,1966).

O conhecimento sobre os vórtices ciclônicos úmidos ainda é bastante limitado. A distribuição de nebulosidade associada aos vórtices ciclônicos em altos níveis foi determinada em diversos trabalhos na esperança de esclarecer a sua dinâmica.

Os VCAN sobre o oeste do Pacífico Norte são observados freqüentemente nas imagens de satélites durante os meses de verão. Eles se formam ao redor da borda sudoeste do cavado do Pacífico médio e movem-se ao longo da periferia sul da Alta do Tibet. Nas imagens de satélite, é observado que os ciclones ocasionalmente interagem com os distúrbios de ondas na troposfera inferior e iniciam tempestades tropicais e em alguns casos tufões (Sugi e Kanamitsu, 1982).

3 - Análise Climatológica dos VCAN no sul da América do Sul.

Na presente climatologia utilizou-se imagens de satélites meteorológicos e dados de análises do European Centre for Medium Range Weather Forecasts (ECMWF). O período utilizado compreende janeiro de 1980 a dezembro de 1989, perfazendo um total de dez anos. A área de estudo compreendeu as longitudes de 0o a 120o W e as latitudes de 0o a 70o S. Através desta climatologia verificou-se a freqüência dos VCAN com a determinação das estações do ano preferenciais para sua ocorrência.

Os resultados obtidos através da análise visual das imagens de satélites mostram que próximo da Cordilheira dos Andes alguns VCAN desintensificam-se, tornando-se pouco ou nada visíveis e outros dissipam-se completamente. Entretanto, existem também aqueles que após atravessar os Andes, intensificam-se.

A tabela 1 mostra o número médio em cada mês (nos dez anos), de VCAN, que se formam no Pacífico Sudeste, que se dissipam, e que alcançam o Oceano Atlântico.

Observa-se que:

a) ocorrem VCAN, no Pacífico Sudeste, o ano inteiro;

b) o maior número de VCAN é observado nos meses de inverno (JJA);

c) no mês de julho, em média, ocorre o maior número de formação de VCAN por ano e é neste mês que ocorre também a maior freqüência dos VCAN que chegam até o Oceano Atlântico;

d) a freqüência mínima, ocorre no mês de março;

e) o mês de março apresenta também a menor freqüência de VCAN que chegam até o Oceano Atlântico;

f) cerca de 60,54% dos totais dos VCAN chegam até o Oceano Atlântico;

g) o mês de agosto apresenta a maior freqüência de VCAN que se dissipam na costa oeste Sul Americana e o mês de outubro o de menor freqüência;

Os resultados acima apresentados em (a) e (b), concordam com os resultados encontrados por Palmer (1951) e Simpson (1952), que constataram a formação de vórtices deste tipo em qualquer época do ano e com o maior número de ocorrência no inverno. Isto indica que os VCAN que se formam no Oceano Pacífico Sudeste são do tipo Palmén.

Referências Bibliográficas:

Cavalcanti, I.F.A. 1982. Alguns aspectos da circulação da atmosfera próximo à América do Sul e interações com a região Antartica. São José dos Campos, INPE. (INPE-3308-PRE/618).

Fortune, M.A., 1982. A severidade da grande geada de 1981: uma avaliação por satélite em tempo real. São José dos Campos, INPE. (INPE-2586-PRE/234).

Frank, N.L., 1970. On the energetics of cold lows. Proceendings of the Symposium on Tropical Meteorology, Americam Meteorological Society, EIV I-EIV 6, Jun.

Frank, N.L., 1966. The weather distribution with upper tropospheric cold lows in the tropics. U.S Weather Bureau, Southern Region, Technical Memorandum no 28.

Gan, M.A; Kousky, V.E, 1982. Estudo observacional sobre as baixas frias da alta troposfera nas latitudes subtropicais do Atlântico Sul e Leste do Brasil. São José dos Campos, INPE,. (INPE -2579-PRE/227)

Kousky, V.E.; Gan, M.A. 1981. Upper tropospheric cyclonic vortices in the tropical South Atlantic. Tellus, 36(6):538-551, Dec.

Palmer, C.E. , 1951. On high-level cyclones originating in the tropics. Transactions of Americam Geophysics Union, 32(5):683-695.

Rao, V.B.; Bonatti, J.P., 1987. On the origen of upper tropospheric cyclonic vortices in the South Atlantic Ocean and abjoining Brazil during the summer. Meteorology and Atmospheric Physics, 37, 11-16.

Sadler, J.C., 1976. Tropical cyclone initiation by the tropical upper tropospheric trouhgh. Rep. no 75-2, Departamento de Meteorologia, University of Hawaii, Honolulu.

Sakuragi, J., 1992. Sondagens TOVS: impacto na análise sinótica entre 18 e 19 de março de 1991 na regiào Sul e Sudeste do Brasil. São José dos Campos, INPE.(INPE-5497/TDI/512).

Silva Dias, M.A; Grammelsbacher, E., 1991. A possível ocorrência de tornado em São Paulo no dia 26 de abril de 1991: um estudo de caso. Revista Brasileira de Meteorologia,6(1-2).

Simpson, R.H., 1952. Evolution of the Kona storm, a subtropical cyclone. Journal of Meteorology, 9(sf):24-35.

Sugi, M.; Kanamitsu, M. 1982. A study of a subtropical upper level cyclone using JMA operational forecast model. Journal of the Meteorological Society of Japan,60(4).